domingo, 11 de maio de 2008

é TECIDO nº 6

Abril/ 2008
Cariacica/ Vitória - ES – Brasil

Os proprietários do nada que dão tudo de si [1]

Por H. Lima
Estudante do curso de Geografia da UFES

Uma voz fala no auto falante: associado X (falando o nome da pessoa) compareça a seção 14 ou então aquela assim: colaborador Z comparecer ao setor de bebidas. Mas porque o uso dos termos associado ou colaborador quando na realidade os proprietários dessas empresas vêem essas pessoas como simples empregados, meros componentes de uma engrenagem?

Ao nomear o homem/ mulher como empregado o seu psicológico reage como se ele/ ela fosse um individuo dispensável e sem muita importância para aquela empresa, logo suas funções serão desenvolvidas sem muito afinco.

O mesmo não ocorre quando é utilizada a nomenclatura associado ou colaborador, esses termos causam no indivíduo um falso sentimento de posse, ora, se ele é associado logo ele é parte da empresa e assim deve trabalhar exaustivamente para que a mesma possa evoluir e aumentar sua lucratividade a cada dia.

Um primo meu trabalha numa empresa de cobrança, dessas que ficam ligando pra casa das pessoas todo o tempo fazendo ameaças psicológicas caso as pessoas não paguem suas dívidas. Uma vez conversando com ele perguntei se essa tal empresa que ele trabalha existe só aqui no Espírito Santo ou se tinha filiais em outros estados, a resposta dele foi a seguinte: “nós temos várias filiais por todo o Brasil”, certamente o dono da empresa nem sabe da existência da pessoa dele.

A Ideologia do Funcionário do mês. O que se esconde atrás do sorriso largo e dos olhos Brilhantes!?

Um grande sorriso feliz e olhos brilhantes acompanhados de um boné e uma camisa, ambos com o logotipo da empresa estampado. Abaixo a frase que enche aquele homem/ mulher de orgulho “Fulando de Tal – Funcionário do mês” a foto está colocada numa moldura de madeira de péssima qualidade, dessas baratinhas compradas em lojas que se dizem ser de preço único. O quadro é fixado em um local onde muitos clientes e colegas de trabalho irão ver, comentar e parabenizá-lo/a. esse é o tipo de “estímulo” que muitas empresas “ofertam” aos seus “associados” ou “colaboradores” haja vista que dessa forma é muito mais fácil e barato impor que todas/ os se “dediquem” ao máximo a empresa, afinal qual deles não quer ser o destaque do mês naquela filial?

Mas quem é o funcionário do mês? O que está escondido atrás daquele orgulho fotografado?
O funcionário do mês é aquele homem/ mulher que trabalha de domingo a domingo e que quando tem um momento de descanso é em dia de semana quando o filho está na escola ou a esposa/ marido está no trabalho, para ele/ ela não existe dia de lazer existe apenas um dia em que não terá que ir à empresa e isso a contragosto do empresário.

O funcionário do mês é aquele que mal pode dar atenção ao seu filho e muitas vezes têm discussões pesadíssimas com a esposa/ marido porque as contas do mês superaram o salário recebido, ele/ ela não acompanha o crescimento do seu filho, raramente se diverte com a esposa/ marido, mesmo querendo não pode freqüentar uma sala de aula devido à incompatibilidade de horário trabalho-escola ou pelo cansaço físico-mental devido às cobranças que lhe são impostos em seu ambiente de trabalho.

Ela/ ele quando “solicitado” trabalha 10 ou 12 horas, pois precisa compensar a falta do colega que “inventou” de adoecer e recebeu um atestado médico autorizando ficar um dia em casa para se tratar.

Sua fonte de informação é o jornal nacional e sua diversão são os jogos de futebol e as novelas.
Sua moradia muitas vezes é alugada e localizada em favelas ou então mora de favor. Acorda cedo, enfrenta terminal do transcol, ônibus lotado, corre pra bater o cartão no horário, se não é desconto no fim do mês.

Na empresa enfrenta a arrogância do gerente (que é outro explorado e não percebe), os maus tratos dos clientes estressados ou aqueles que pensam ser iluminados por serem ricos e/ ou terem curso superior e por isso são melhores que o incompetente preguiçoso que “preferiu” trabalhar em um supermercado ao invés de estudar.

Ela/ ele compra o celular da moda e parcela em 12 prestações, pois a mídia lhe diz que isso é importante e ele vê isso como uma auto-afirmação social.

Na reunião avaliativa coordenada pela gerência escuta ofensas discretas ou não e mais cobranças. Às vezes pensa em pedir demissão, mas lembra do amigo que teve tal atitude e até hoje está desempregado ele também sabe que lá fora o exército de reserva é imenso, vários querem a sua vaga, então logo é descartada essa idéia.

Nem todos os seus companheiros de trabalho pensam assim, alguns deles questionam ordens, não seguem a risca o ditado da empresa e exigem melhorias salariais.

Essas/es jamais terão suas fotos emolduradas e exibidas na parede, na verdade todas/ os essas/ es serão demitidas/os aos poucos ou em massa servindo de exemplo para os demais, afinal o ideal é ter um grande grupo onde todos trabalham exaustivamente com um objetivo único, propiciar o crescimento de “sua” empresa e receber como gratificação não parte do lucro faturado, mas sim sua fotografia em uma moldura com a frase “Funcionário do Mês”.

[1] As conversas com alguns conhecidos que trabalham em supermercados e minhas observações sobre o tratamento que empresas desse e de outros seguimentos dispensam aos seus funcionários foram as principais influências para a produção desse texto.

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