domingo, 11 de maio de 2008

é TECIDO nº 5

Dezembro/ 2007
Cariacica/ Vitória ES – Brasil
A Causa da violência na Grande Vitória é um copo cheio ou o esvaziamento das oportunidades?

Por H. Lima
Estudante do curso de Geografia da UFES

É muito fácil justificar que a violência na Grande Vitória deve-se aos bares abertos durante toda a noite, assim a população esquece dos desníveis sociais existentes não só no ES como também em todo o Brasil.

Caso essa tal Lei Seca pegue ela vai atuar apenas nos bares localizados nos bairros pobres da GV, e não é necessário pensar muito para chegar a essa conclusão. Os bares das favelas são os únicos locais que os trabalhadores possuem para beber, rir um pouco e esquecer pelo menos por alguns momentos que na segunda-feira começa tudo novamente, ou seja, mais uma semana de enfrentamento de terminais rodoviários do transcol, ônibus lotados e a exploração de seus patrões.

A maioria dessas pessoas trabalha no comércio, principalmente lojas ou supermercados, muitos não possuem nem o ensino médio completo. Existem também aqueles que são desempregados e descolam “outras atividades” para faturar um troco.

Todos são colocados no mesmo saco pelo Estado e acusados de causarem crimes devido ao consumo de bebidas e drogas nos bares que ficam abertos noite adentro. Não consigo imaginar viaturas da polícia chegando ao triângulo das bermudas ou nas áreas consideradas nobres de Vila Velha e exigirem o fechamento deste e daquele bar pois já ultrapassaram o horário limite estabelecido pelo Estado.

O Espírito Santo é um estado pequeno e rico, porém como acontece em todo o país essa riqueza concentra-se nas mãos de um pequeno grupo, que tem suas posses vigiadas, higienizadas e construídas por um exército de vigilantes, empregadas domésticas e trabalhadores da construção civil, mal pagos e pressionados o tempo inteiro. Um exemplo claro são as ilhas do Frade e do Boi, é só dar uma voltinha lá e constatar, mas antes tem que passar pela guarita de entrada e ser filmado é claro.

As campanhas publicitárias colocam a atual administração do Estado como a que mais investiu em educação até hoje, mas para constatar a veracidade dessa propaganda basta visitar as escolas públicas da GV, quero citar aqui a escola Paes Barreto localizada ao lado da Secretaria de Educação do Estado, o que se vê é um complexo com total aspecto de abandono, paredes velhas e em volta um terreno com muito mato e postes estragados sustentando luminárias enferrujadas. Em 2006 fiquei alojado por alguns dias em escola fora da GV, mais precisamente em Cachoeiro de Itapemirim, as condições da escola também não era das melhores, ao invés de chuveiros os banheiros tinham pedaços de cano de onde saía a água do banho, cadeiras e quadros escolares velhos entre outros problemas, essas são as escolas que propiciam muitas oportunidades aos estudantes capixabas.

Médicos registraram queixa em delegacia de polícia contra o Estado capixaba devido a superlotação no Hospital São Lucas, onde doentes disputam espaços no chão para se “acomodarem”. O apoio governamental a atividades de empresas como Aracruz Celulose, Arcelor-Mittal, Vale do Rio Doce entre outras é cada vez maior. Do mesmo tamanho ou até maior é o descaso com os serviços básicos que a população deveria contar já que os impostos embutidos nos produtos vendidos são recolhidos para isso.

Porém é muito mais viável eleger os bares que são os “locais de lazer” das favelas sem rua pavimentada, sem praça, sem teatro, sem cinema ou qualquer outro espaço para diversão, como principal causador da crescente violência na GV. Já posso imaginar as viaturas do BME/ PMES chegando no bar do seu Zé, de dentro dela saltam homens armados e truculentos aos gritos de “todo mundo pra parede” seguido das frases “cala boca vagabundo” e “cadê seu alvará”.

A determinação é a seguinte: se você tem dinheiro para gastar nos shoppings e bares caros da GV você pode sair de casa e se divertir, agora se você é apenas um assalariado que seu dinheiro te permite tomar apenas uma cerveja ou uma dose de pinga e aproveitar o resto do tempo para papear com seus amigos, esqueça, a partir da Lei Seca capixaba você terá que se confinar dentro da sua casa e sair apenas para trabalhar.

Os altos índices de violência no Espírito Santo particularmente na Grande Vitória, devem-se ao fato de que os governos estadual e municipais, estrategicamente, ignoram o real significado do termo Políticas Públicas ficando este reduzido à apenas algumas “operações” policiais. Não existe uma educação escolar que forme o indivíduo como um ser pensante e que saiba que ele tem capacidade de influenciar na construção de uma sociedade menos desigual, para todos os lados o que vemos é uma explosão de cursos técnicos que preparam as pessoas para receber e executar ordens em troca de salários pequenos que parecem ser grandes quando comparados ao valor do medíocre salário mínimo brasileiro.

Claro que para mudar toda essa estrutura que privilegia o topo da pirâmide, muitas pessoas acostumadas a ficar com a maior parte do bolo não iriam achar isso nada interessante até porque muitos deles são financiadores de campanhas eleitorais.

Então o sistema funciona da seguinte forma: uma parte da população é treinada para ser explorada nas diversas áreas de trabalho e agradecer por ter esse emprego. Aqueles que não foram recrutados para trabalhar nas empresas têm de buscar sua sobrevivência por meio dos trabalhos considerados pela elite como vergonhosos e geradores de violência, a prostituição, a cata de material reciclável, o avião da favela, o cara que abre um boteco, o gerente da boca de fumo.

Diante destes problemas o Estado escolhe a forma mais “fácil” de “resolver” o caos, Lei seca e “atuação” policial, e quem deve a justiça tem de pagar, vai cumprir pena em alguma das cadeias superlotadas e infestadas de doenças, só assim a GV passará a ter noites e manhãs de tranqüilidade dormindo, acordando e sendo abençoada pelo pó preto das empresas poluidoras que contam com o apoio incondicional do Estado capixaba.

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